Em Mato Grosso, 22 crianças e adolescente foram adotadas até maio de 2023. No ano passado foram concluídos 82 processos de adoção no Estado. Os dados são do Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento do Conselho Nacional de Justiça (SNA/CNJ). Com o intuito de aumentar esse número, o Poder Judiciário de Mato Grosso, por meio da Corregedoria-Geral da Justiça promove a Semana Estadual da Adoção e nesta quarta-feira (24/05) ocorreu o Seminário virtual “As diversas complexidades da adoção”.
O evento é promovido pela Associação Mato-grossense de Pesquisa e Apoio à Adoção (Ampara) e integra a programação da Semana Estadual do Judiciário, realizada em alusão ao Dia Nacional da Adoção, celebrado em 25 de maio. A juíza da 1ª Vara Especializada da Infância e Juventude de Cuiabá, Gleide Bispo dos Santos, ministrou uma palestra e destacou que atualmente 56 crianças e adolescentes estão disponíveis para adoção, sendo que 21 são de Cuiabá. “Destas da Capital, oito são crianças e adolescente com alguma deficiência, autismo ou que necessita de suporte de home care, nove são crianças saudáveis e quatro são adolescentes. Ao todo 80 crianças e adolescentes estão em oito casas lares em Cuiabá”, detalhou.
A magistrada está há 11 anos a frente da Vara da Infância e Juventude na Capital e destacou que houve uma evolução na busca de perfis de crianças e adolescente pelos pretendentes a adotar. “Ainda existe uma grande preferência dos pretendentes por crianças de até dois anos, mas hoje já não temos grande dificuldade de encontrar uma família substituta para crianças de até 11 anos. A grande adversidade é a adoção tardia, que são adolescentes, grupos de irmãos, ou ainda de jovens que apresentam alguma condição especial de saúde e/ou pertencem a minorias étnicas”, revelou.
Gleide Bispo afirmou que o sistema SNA/CNJ tem sido um grande aliado para encontrar pretendentes nesses casos. “Lá encontramos diversas informações como todas as crianças em unidades de acolhimento, os processos de destituição das varas, controla o vencimento do cadastro dos pretendentes, que tem que ser renovado a cada três anos, entre outros pontos. Para o juiz foi um avanço muito grande porque tínhamos que fazer a consulta manualmente. Imagina ligar para os 500 pretendentes que temos na lista”, relembra.
Durante o seminário, a magistrada lembrou-se de um caso marcante. Um menino portador de HIV. “Eu compartilhei em um grupo de juízes das Varas da Infância e Juventude, que estava com esse perfil de criança para adoção e uma colega do Rio de Janeiro disse que tinha um pretendente. Fiz o contato, ele conheceu o menino virtualmente inicialmente, depois passou a vir até Cuiabá e o caso acabou se tornando uma adoção muito bem sucedida. Posteriormente ele voltou a nos procurar porque tinha um garoto da Casa Lar, que o filho dele gostava muito, e apesar de ter déficit cognitivo, ele disse que iria buscar o seu outro filho. Então vemos que existe um pretendente certo para cada criança basta uma busca ativa”.
A juíza revelou um problema recorrente que os magistrados têm enfrentado pelo país. “A história se repete: o casal encontra uma gestante que quer entregar a criança para adoção. Após o parto, o bebê é registrado pela mãe biológica e pelo homem, como se fosse o pai biológico. Algum tempo depois, o casal procura a Vara para que a esposa adote oficialmente a criança, com a história de que o marido teve um filho fora do casamento e que a esposa perdoou a traição e que se apegou a criança. Nesses casos o que nós temos feito é solicitar o exame de DNA para os dois pais, justamente para evitar essa fraude. A criança em si não é punida, mas é preciso que os adultos saibam que existem consequências, do ponto de vista criminal e civil, pois prejudica as crianças na fila e os pretendentes que optaram pela adoção de forma legal”, afirmou.
O procurador de Justiça do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MPE-RJ), Sávio Bittencourt, destacou uma regra jurídica que tem que ser observada pelos juízes da Primeira Instância, o tema 622 do Supremo Tribunal Federal (STF), que trata da paternidade/maternidade sócio afetiva. “A adoção é uma forma tradicional em que pessoas que não são pais biológicos assumem a paternidade a partir da lógica da afetividade não baseada em laços sanguíneos. A família, independente da configuração, precisa cumprir o papel fundamental, que é o de criar crianças e adolescentes com afeto, carinho e amor”, afirmou.
E um dos desafios apontado pelo procurador é como a afetividade é tratada no processo jurídico. “O profissional que for definir com quem a criança ou adolescente vai ficar, seja na instituição, na família extensa ou substituta, precisa se basear no afeto, mas como medir? É preciso ficar claro desde o primeiro estudo social, que o interessado está presente na vida da criança e é uma referência de afetividade e afinidade, além disso, é importante que essa definição ocorra o mais rápido possível”, argumentou.
“Toda institucionalização em si é uma lesão ao Direito da criança, e quanto mais ela demora, mais danos psicológicos são causados. Muitas vezes esperamos que esse pais adotivos consigam lidar com todo esse danos psicológicos que as crianças tem, de alguém que passou 4 ou 5 anos em uma Casa Lar, mas nem sempre é assim. A verdade é que precisamos desenvolver políticas públicas de amparo à família adotiva e que não sejam só frutos dos grupo de adoção. Com disponibilização de psicólogos, assim como é feito para a família biológica quando está ocorrendo a destituição. E acima de tudo evitar a longa permanência em instituições, porque o que as nossas crianças e adolescentes precisam é de carinho e afeto”, finalizou.
#Paratodosverem – Esta matéria possui recursos de texto alternativo para inclusão das pessoas com deficiência visual. Foto 1: Imagem colorida. Print da tela de transmissão do Seminário a juíza Gleide Bispo fala aos participantes. Foto 2: Imagem colorida. Print da tela de transmissão da fala do procurador Sávio Bittencourt.