Com o objetivo de conscientizar servidores públicos e agentes que atuem direta ou indiretamente na entrega voluntária prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente, a 2ª Vara da Comarca de São Félix do Araguaia realizou, no último dia 13, uma palestra com o tema “Nuances do procedimento de entrega voluntária, formas de acolhimento da gestante e consequências do desrespeito a tal direito”. O evento, que ocorreu no Plenário da Câmara Municipal, reuniu diversas autoridades.
O juiz da 2ª Vara da Comarca de São Félix do Araguaia, Adalberto Biazotto Junior, destacou que a entrega voluntária está prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e que é dever dos Juizados da Infância e Juventude receber o recém-nascido cuja mãe, por razões que ela deseja ou não externar, quer entregar o bebê para adoção. Isso porque a criança tem o direito à convivência familiar e comunitária.
“A mãe manifesta seu desejo de não exercer a maternidade ao sistema de saúde ou ao Poder Judiciário de seu município, seja durante a gestação, seja logo após ter o bebê. A grande maioria faz isso durante a gestação, quando começa a fazer os exames pré-natais, geralmente porque não há condições econômicas de criar a criança. Ali, a mulher já começa a receber atendimento psicológico, porque, depois que a criança nascer, a lei impõe ao juiz que recolha a manifestação dessa mulher, dizendo que não deseja ser mãe. Isso se dá em uma audiência com a presença do Ministério Público”, explicou o magistrado.
Adalberto Biazotto Junior esclareceu ainda que todos os procedimentos da entrega voluntária, de acordo com a lei, garantem o sigilo total à mulher que faça a entrega voluntária, incluindo o segredo sobre o próprio nascimento da criança. A ideia é proteger a gestante que não possa ou não queira ficar com o bebê, garantindo que ela depois não será responsabilizada.
“A legislação prevê que a mulher deve ser atendida por uma equipe técnica multidisciplinar, composta por profissionais de serviço social e psicologia. A equipe produzirá um parecer para o juiz, que em audiência com a gestante dará a palavra final sobre a entrega. Caso haja concordância de todos, a criança é encaminhada para acolhimento imediato por família apta, que esteja inscrita no Sistema Nacional de Adoção e Acolhimento (SNA). A mãe biológica tem dez dias para manifestar arrependimento. Depois desse prazo, perde os direitos familiares sobre a criança”, esclareceu o magistrado.
Os promotores de Justiça Alysson Antônio de Siqueira Godoy e Fabrício Miranda Mereb falaram sobre as consequências cíveis, penais e administrativas da omissão dos agentes públicos que, sabendo do interesse da gestante em exercer o direito de entrega voluntária, tentam embaraçar ou, então, omitem-se em comunicar as autoridades competentes. Ambos fizeram questão de frisar que registrar o filho de outra pessoa como seu, atribuir o parto alheio como próprio ou ocultar criança para que não seja registrada são crimes previstos no Código Penal, com pena de dois a seis anos de reclusão.
Também é crime prometer ou efetivar a entrega de criança mediante pagamento ou recompensa, com pena prevista de um a quatro anos de reclusão, além de multa. Incide na mesma pena quem recebe o menor. O abandono de incapaz e de recém-nascido também é crime previsto no Código Penal. “O objetivo é saber se esse é mesmo o interesse, se a mãe está passando por algum transtorno de ordem psíquica e se, quando ela melhorar, vai desejar esse filho. Tem uma análise psicossocial com psicóloga para avaliar se é a vontade real dela. É importante. Essa decisão não tem volta, a adoção é irrevogável. Já as adoções irregulares, que são todas aquelas realizadas sem a intervenção do Poder Judiciário, constituem risco para todos os envolvidos”, explicou o promotor Alysson Godoy.
O defensor público Daniel Bezerra de Oliveira e o delegado da Polícia Judiciária Civil de São Félix do Araguaia, Thiago Meira deram mais detalhes sobre o procedimento para entrega voluntária. “Ao contrário do que muita gente pensa, a mãe que dispõe seu filho para adoção não comete crime, a lei permite a entrega para garantir e preservar os direitos e interesses do menor. Em contrapartida, a mãe que desampara ou expõe seu bebê a perigo comete o crime de abandono de recém-nascido, descrito no artigo 134 do Código Penal”, disse o delegado.
Também participaram do evento os presidentes das Câmaras Municipais de São Félix do Araguaia e de Alto Boa Vista, respectivamente, vereadores Jusmar Alves e Alessandra Pereira; secretários municipais e equipes da Assistência Social, conselheiros tutelares e população em geral.
Coordenadoria de Comunicação da Presidência do TJMT
imprensa@tjmt.jus.br
Fonte: Tribunal de Justiça de MT – MT