O foco na pessoa usuária de droga e não na substância foi defendido pela psicóloga Maria Angélica de Castro Comis, na manhã desta sexta-feira (30), durante o encontro virtual “Direitos Humanos e políticas sobre drogas”, promovido pela Procuradoria de Justiça Especializada na Defesa da Cidadania, Consumidor, Direitos Humanos, Minorias, Segurança Alimentar e Estado Laico. A palestrante falou sobre “Redução de danos e políticas públicas para pessoas que usam drogas: uma análise sob a ótica dos Direitos Humanos”.
Maria Angélica Comis iniciou a apresentação questionando quem são as pessoas que usam drogas e dizendo que, embora seja comum pensar inicialmente nas cenas de uso aberto nas cidades, os usuários estão em todos os lugares, inclusive aqueles que se valem de substâncias psicoativas como álcool e remédios antidepressivos. Defendeu ser fundamental se desprender dos estereótipos criados socialmente. “O uso de substâncias psicoativas na nossa história acontece de diferentes maneiras e em diferentes contextos”, afirmou.
A palestrante lembrou que “a saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”, conforme o artigo 196 da Constituição Federal. Falou sobre promoção da saúde, riscos e vulnerabilidades do que usam drogas, sobre a necessidade de respeitar os direitos fundamentais da pessoa humana e sobre as particularidades que devem ser consideradas para a redução dos danos.
“É fundamental que tenhamos em mente que ao falarmos em redução de riscos e danos, estamos falando em promoção em saúde”, defendeu Maria Angélica de Castro Comis, citando as salas de consumo de drogas ilícitas como um exemplo. Segundo a psicóloga, as instalações para consumo assistido de droga existem há mais de 30 anos na Europa, com objetivo de reduzir o uso em espaços públicos, prevenir a transmissão de doenças com o compartilhamento de agulhas e seringas, promover o acesso a materiais esterilizados e mais seguros, evitar as mortes por overdose e colocar os consumidores em contato com outros serviços sociais e de saúde.
Maria Angélica Comis lembrou que a Política de Redução de Danos no Brasil começou no fim da década de 80 em Santos (SP), quando o município instituiu como política pública a troca de seringas usadas para consumo de drogas, de modo a reduzir a transmissão do vírus HIV, causando polêmica por ser considerada apologia ao uso de drogas e não uma política de saúde. Contou que, em 1995, a Universidade Federal da Bahia instituiu o primeiro programa de troca de seringas no país, entre outras experiências. E reforçou que o objetivo é diminuir os danos físicos, psicossociais e jurídicos relacionados ao uso de drogas.
“É fundamental que as pessoas que usam drogas tenham a possibilidade de ter acesso à moradia, de não serem estigmatizadas, de terem seus direitos reconhecidos e que possam acessar serviços de qualidade, que respeitem a sua dignidade”, defendeu. E encerrou destacando que não existe uma saída mágica. “As soluções são complexas porque são problemas complexos e envolvem diversos setores, desde a moradia, que ajuda a organizar o indivíduo. Melhorando a qualidade de vida, o consumo de substâncias diminuiu consideravelmente. Então não é focar em ficar abstinente ou não, e sim em melhorar as condições de vida para que a pessoa possa gozar de outras coisas que não seja só usar uma substância”, finalizou.
Atuando como debatedora, a promotora de Justiça Maria Coeli Pessoa de Lima agradeceu pelos ensinamentos e contou que no dia-a-dia das Promotorias de Cidadania os integrantes do MPMT trabalham diariamente com situações que envolvem o uso de substâncias psicoativas. De acordo com ela, esse é um grande desafio para a instituição, de modo a conseguir melhorar a situação da pessoa e de toda a família. No encerramento, o promotor de Justiça Carlos Rubens de Freitas Oliveira Filho reforçou a importância do debate e da responsabilidade do Ministério Público com relação ao tema.
Fonte: Ministério Público MT – MT