A natureza jurídica das medidas protetivas de urgência da Lei Maria da Penha esteve no centro do debate do painel “Tutela inibitória no Processo Penal”, na tarde de sexta-feira (22), durante o “V Encontro do Sistema de Justiça Criminal de Mato Grosso – efetividade da Jurisdição Penal”, realizado em Chapada dos Guimarães. A professora doutora em Direito Natália Oliveira apresentou a tese, que se tornou livro, de que as medidas protetivas possuem caráter de tutela inibitória. Ou seja, protegem a vítima quanto à reiteração do ilícito penal, são autônomas em relação à ação penal e não perdem o efeito quando do término do processo.
A palestrante inicialmente abordou a efetividade da jurisdição penal, pontuando que a natureza de tutela inibitória no processo civil é bem trabalhada porque consta no Código de Processo Civil, mas que na esfera penal encontra resistência. “Elas podem não ter na lei essa denominação, mas existem”, afirmou, relatando os fundamentos jurídico-dogmáticos para essa classificação.
Autora do livro “A Tutela Inibitória no Processo Penal – Efetividade do Processo na Proteção da Paz e da Liberdade”, Natália Oliveira defendeu que a concessão da medida protetiva pode prevenir a prática de outro ilícito. Citou levantamento realizado em Minas Gerais, com cruzamento de dados da Polícia Militar, que apontou que vítimas de feminicídio consumado já haviam procurado o Estado antes, enquanto vítimas de ameaça, lesão corporal ou homicídio tentado.
O juiz João Filho de Almeida Portela, que atua na Execução Penal em Rondonópolis (a 212km de Cuiabá), discordou do posicionamento da palestrante sob argumento do caráter garantista da Constituição Federal e defendeu que a medida protetiva é de tutela cautelar. Criticou a “hipótese de se impor uma medida restritiva, com possibilidade concreta de prisão por descumprimento, sem assegurar a esse suposto agressor uma possibilidade de contestar, responder e impugnar”. Apontou que a “absurda maioria das medidas protetivas são concedidas sem lastro probatório” e reforçou que o juiz não é herói contra o crime, não é agente de segurança e nem justiceiro, não devendo assim julgar conforme a moralidade social e sim observar as leis, a Constituição e tutelar direitos e garantias fundamentais.
No encerramento do debate, Demóstenes Torres, procurador de Justiça aposentado do Ministério Público de Goiás (MPGO), considerou o tema intrigante. “A tutela inibitória é flagrantemente de natureza penal, mas esse entendimento não é tranquilo”, observou, acrescentando que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) não aceita a tutela inibitória penal e que a considera uma medida cautelar, revogável, reversível e que perdura enquanto existir o processo. Ao se voltar para a palestrante, pediu que não desanime. “Essas naturezas jurídicas são assim mesmo, muitas pessoas não compreendem de início a necessidade de que isso possa vir a contribuir para o Direito”, discursou.
Presidente da mesa, o desembargador Paulo da Cunha agradeceu aos expositores do painel pelas contribuições para o debate e reconheceu o “imensurável trabalho” da palestrante para o aperfeiçoamento da Justiça Criminal.
Fotos: Ednilson Aguiar.
Fonte: Ministério Público MT – MT