A ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, esteve com uma comitiva nesta terça-feira (6) em Douradina (MS), em reunião com lideranças indígenas e produtores rurais, onde grupos guarani-kaiowá ocuparam áreas rurais que reivindicam como territórios tradicionais de seus povos.
As recentes ocupações, que os indígenas classificam como “retomadas”, reacenderam a violência contra os guarani-kaiowá, imersos em um conflito fundiário que se arrasta há décadas. Só no último fim de semana, lideranças indígenas e organizações indigenistas denunciaram dois grandes ataques com homens armados a acampamentos montados no interior de uma área já delimitada para abrigar a Terra Indígena Panambi-Lagoa Rica, em Douradina.
De acordo com o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), órgão vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), ao menos nove indígenas foram feridos durante os ataques. Barracos, pertences pessoais e símbolos da cosmologia guarani-kaiowá foram destruídos e incendiados. Vídeos compartilhados nas redes sociais flagram a presença ostensiva de caminhonetes, tratores e automóveis ao redor das áreas de retomadas.
“Viemos aqui em uma missão de paz. É isso que a gente busca”, disse a ministra a um grupo de produtores e trabalhadores rurais com quem conversou na companhia da presidenta da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), Joênia Wapichana; do coordenador geral de Operações da Força Nacional de Segurança Pública, Luis Humberto Caparroz.
“Um conflito dessa forma não interessa a vocês [produtores rurais], não interessa aos indígenas e não interessa ao governo [federal]. Não interessa a ninguém”, afirmou a ministra, reconhecendo a necessidade de ouvir todos os lados envolvidos na questão. “Entendemos que temos que escutar ambos os lados. Viemos conversar com vocês para buscar essa solução. E para falarmos da paralisação dos ataques. Não é possível continuar com essa situação de insegurança. Vocês falaram de insegurança, os indígenas estão em uma situação insegura, e temos que entender que não vai ser assim, com briga, com armas e ataques, que vamos resolver [o conflito]. Nem vocês, nem eles [indígenas], querem ficar manchados de sangue”, afirmou a ministra.
“Vimos que é realmente necessária a presença da Força Nacional para garantir a segurança e a integridade física dos povos indígenas dessa área de retomada, para evitar que mais conflitos ocorram. Não pactuamos com a violência. Estamos aqui com o objetivo de pacificar [a região] a partir do diálogo e da presença do Estado brasileiro”, disse a ministra, garantindo que o governo federal vem atuando para concluir os processos demarcatórios de novas terras indígenas, paralisados por recursos judiciais interpostos por produtores rurais que afirmam ser os legítimos donos das áreas reivindicadas pelos indígenas.
“Estamos trabalhando para que os processos demarcatórios em Mato Grosso do Sul e em todos os estados brasileiros sejam retomados. Não é possível que os indígenas continuem sofrendo com tamanha violência em meio a esses conflitos. Queremos garantir a segurança dos povos nos seus territórios”, disse a ministra.
Prevista para ter cerca de 12 mil hectares, o correspondente a aproximadamente 12 mil campos de futebol oficial, a Terra Indígena Panambi-Lagoa Rica foi delimitada em 2011, mas recursos judiciais impediram a conclusão do processo e a retirada de não indígenas do local.
De acordo com a Federação da Agricultura e Pecuária de Mato Grosso do Sul (Famasul), as áreas já delimitadas e declaradas como de usufruto exclusivo indígena totalizam, no estado, mais de 283 mil hectares espalhados por 903 propriedades rurais de 30 cidades sul-mato-grossenses, o que, segundo a entidade, geraria grande “insegurança jurídica no campo”.
“Tanto os indígenas quanto os produtores rurais são vítimas. Em Mato Grosso do Sul, por exemplo, [indígenas reivindicam] terras oriundas da Guerra do Paraguai [1864/1870] onde o Brasil, quando obteve a vitória, alocou produtores rurais para manter a soberania nacional. Agora, 150 anos depois, não podemos tratar esses produtores como invasores. Não podemos resolver uma injustiça criando outra”, sustentou, em nota, Marcelo Bertoni, presidente da Famasul e da Comissão Nacional de Assuntos Fundiários da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA).