Katiuscia Torres Soares, de 34 anos, conhecida como Kat Torres, foi condenada a oito anos de prisão por submeter uma mulher a tráfico humano e condições análogas à escravidão. Uma investigação sobre acusações de outras mulheres contra Kat está em trâmite no Brasil, segundo a BBC.
A sentença da ‘guru espiritual’ foi decretada em 28 e junho deste ano, pelo Marcelo Luzio Marques Araújo, da 10ª Vara Federal fluminense.
De acordo com o juiz, a influenciadora atraiu a jovem Desirrê Freitas, de 28 anos, para os Estados Unidos com o objetivo de exploração sexual.
Kat foi presa em outubro de 2023, quando chegou ao Brasil com outras dezenas de brasileiros a bordo, todos deportados por estarem irregulares nos EUA. A influenciadora e ex-modelo teve a custódia alterada para prisão preventiva no Brasil e foi transferida para um presídio feminino em Bangu, na Zona Oeste do Rio de Janeiro.
Segundo o Ministério Público Federal (MPF), Kat Torres expôs Desirrê Freitas a uma rotina degradante desde pelo menos o início de abril de 2022 até o dia 2 de novembro do mesmo ano. A investigação diz que a influenciadora aliciou, alojou e acolheu a suposta vítima, mediante fraude, para submetê-la a trabalho em condições análogas à de escravo; submetê-la a qualquer tipo de servidão e de exploração sexual, se prevalecendo de relações de coabitação e hospitalidade.
“Katiuscia reduziu (a vítima) à condição análoga a de escravo, submetendo-a à jornada exaustiva e sujeitando-a a condições degradantes de trabalho”, disseram os procuradores Orlando Monteiro Espíndola da Cunha e Ana Cristina Bandeira Lins.
Ainda, a garota era obrigada, segundo a denúncia, a dançar num clube de striptease por mais de 13 horas, sem descanso semanal. Ela também teve a foto anunciada num site de prostituição de Austin e San Antonio, no Texas. O perfil oferecia sexo, fetiches e massagem. O lucro também seria entregue à Kat, suposta líder religiosa.
Em uma entrevista ao Globo, Desirrê revelou que nos últimos meses em que foi considerada desaparecida por familiares e amigos, foi forçada a mentir e manter distância deles. Segundo ela, essa situação foi uma farsa planejada por sua mentora anterior, uma pessoa que se apresentava como fria e calculista nos bastidores e nas redes sociais.
Além disso, Desirrê fez um pedido público de desculpas por falsas acusações feitas online, especialmente dirigidas à modelo Yasmin Brunet, que, segundo ela, também foram tramadas por Torres.
O caso de Desirré não foi o único. Surgiram múltiplos relatos envolvendo promessas ilusórias de riqueza, sucesso amoroso e financeiro, direcionadas a seguidoras jovens, atraentes e emocionalmente vulneráveis. Tudo em nome de uma suposta divindade fictícia chamada “A Voz”, título de um livro, às vezes acompanhado do uso do chá alucinógeno Ayahuasca.
As vítimas testemunharam perante o Ministério Público de São Paulo no ano passado. Esses depoimentos foram posteriormente incluídos no inquérito que agora está sob a alçada do Ministério Público Federal, após o caso ser transferido para a esfera federal na Justiça Federal do Rio de Janeiro, estado de origem da ré. O teor das acusações é delicado. Desde então, contudo, o Ministério Público ainda não apresentou novas denúncias relacionadas a essas outras histórias.
Uma das vítimas relatou que passava por dificuldades nos EUA, vivendo nas ruas, quando foi abordada por Kat Torres. A guru fez falsas promessas e da crença na “Voz”, ela disse que acabou cooptada pela coach.
Torres fez a vítima ir ao stripclub, mas a mulher não conseguiu danças ou ter relações com os clientes por se sentir muito exposta e desconfortável. Segundo ela, por pena, os donos da boate teriam dado 100 dólares e a dispensado em seguido. A guru então se irritou pelo baixo valor e pediu que a vítima trabalhasse de doméstica na casa dela, em troca de um teto para morar.
Essa jovem afirma ter sido abordada por Kat Torres quando tinha 18 anos. Ela mostrou mensagens em que a falsa mentora fazia promessas e convidava a seguidora a viajar dos Brasil para os Estados Unidos, oferecendo oportunidades como modelo e explicitamente como “sugar baby”. Naquela época, ainda jovem e ingênua – e virgem, como mencionou -, ela entendia o trabalho como simplesmente acompanhar homens mais velhos em jantares, sem que houvesse envolvimento sexual.
Como seguidora fervorosa da suposta religião criada por Kat naquele momento e acreditando em seus alegados “poderes de clarividência”, ela inicialmente concordou com a proposta, mas acabou desistindo quando confrontada por um grupo de mulheres que já estavam atentas às atividades da “falsa guru”.
O advogado de Kat, Rodrigo Menezes, afirma que recorreu da condenação e diz que ela é inocente. Em abril deste ano, a influenciadora chegou a negar todas as acusações.
“Tive crises e mais crises de riso com tanta mentira que escutei. Todo mundo na sala podia ver que as testemunhas estavam mentindo”, disse à BBC na época.