O governo federal relançou nesta quinta-feira (2) o Bolsa Família , programa de transferência de renda que assumiu formato diferente durante a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), quando era chamado de Auxílio Brasil. Além de ser rebatizado com seu nome original, o Bolsa Família vai voltar a ter diversas características que se perderam nos últimos anos, além de trazer novidades.
Um dos principais destaques é a volta das condicionalidades ao programa. Para receberem o benefícios, as famílias terão que manter as crianças vacinadas e matriculadas nas escolas, e mulheres grávidas terão que fazer o acompanhamento pré-natal completo.
“Quando se fala em retomar o Bolsa Família, não é só uma questão de nomenclatura, mas também uma concepção de política pública”, afirma Paola Loureiro Carvalho, diretora de relações internacionais e institucionais da Rede Brasileira de Renda Básica.
A especialista afirma que a volta do programa representa o retorno de uma política pública de assistência social consistente e unificada, que permite a articulação de governos federal, estaduais e municipais a fim de alcançar o público que mais precisa da transferência de renda. De acordo com Wellington Dias, ministro do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, 700 mil famílias foram incluídas no programa por conta da busca ativa realizada pelo Sistema Único de Assistência Social (SUAS).
Para Paola, o Bolsa Família era um “patrimônio brasileiro” que foi desativado no último governo. “O governo Bolsonaro teve uma postura de redução da política pública de assistência social. Foi um processo de redução, por exemplo, dos acompanhamentos dessas famílias do ponto de vista da educação da saúde, que sempre foram condicionalidades ligadas ao Bolsa Família”, avalia.
Volta das condicionalidades
Gustavo Serra, doutor em Economia e pesquisador do Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades (Made) da Universidade de São Paulo (USP), destaca que um dos aspectos mais importantes do novo desenho do Bolsa Família é justamente o retorno das condicionalidades ao programa.
“Há diversos estudos que verificam impactos positivos das condicionalidades para educação – matrícula, frequência escolar dos filhos de famílias beneficiadas e redução das taxas de evasão escolar, sobretudo para adolescentes – e para a saúde – aumento das taxas de vacinação e acompanhamento de gestantes”, afirma.
Paola relembra que essas condicionalidades, porém, não são obrigações somente das famílias, mas também do Estado, que deve garantir o acesso a direitos. “Historicamente, a discussão que se faz em relação ao acompanhamento das condicionalidades é que a política pública de saúde, educação e assistência também tem essa condicionalidade de saber onde estão as pessoas mais vulneráveis e garantir o acesso ao atendimento para essas pessoas”, afirma a especialista.
Renda mínima per capita
O pagamento do novo Bolsa Família será de R$ 600 por família, valor herdado do Auxílio Brasil, mas haverá o acréscimo de renda extra para famílias com crianças, adolescentes e gestantes. Os valores são os seguintes:
R$ 150 por criança com menos de seis anos;
R$ 50 por criança ou adolescente entre sete e 18 anos;
Paola afirma que esses valores extras são “um avanço do ponto de vista de reconhecer as características individuais de cada família”. Ela acrescenta que muitas famílias estavam preocupadas de não terem benefício extra por terem filhos mais velhos, então o complemento para a faixa de sete a 18 anos é visto de forma positiva.
O governo ainda afirmou que vai garantir renda mínima por pessoa, independentemente da idade. Segundo Wellington Dias, o valor mínimo será de R$ 142 per capita.
Por enquanto, o governo não explicou como atingirá esse valor mínimo por pessoa – se apenas os benefícios extras já são suficientes ou se será necessário um repasse adicional para famílias compostas apenas por adultos.
O valor de R$ 142 é maior do que o limite da extrema pobreza, o que significaria que ela estaria erradicada no Brasil. Atualmente, o CadÚnico considera como extrema pobreza pessoas com renda mensal per capita de até R$ 105. Já a pobreza se refere a pessoas com renda mensal per capita entre R$ 105,01 e R$ 210 – ambas as faixas têm direito ao Bolsa Família.
Injeção na economia
Além dos aspectos sociais, o programa de transferência de renda também serve como uma “injeção” na economia. Gustavo explica que isso tende a gerar um efeito multiplicador ao Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro, que acontece quando o impacto final é maior que a transferência inicial.
“Isso porque as famílias na faixa de renda para o benefício tendem a consumir a totalidade, ou quase, do benefício recebido, estimulando a economia”, explica o pesquisador.
“Especialmente em um momento de crise econômica, o fortalecimento de programas sociais pode evitar um aumento dos níveis de pobreza. Essa redução é verificada em dois momentos: primeiro, temos a redução imediata da pobreza, com a transferência monetária permitindo que essas famílias saiam dessa situação. Segundo, esses programas também contribuem para que a saída da condição de pobreza seja sustentada em um prazo mais longo, dados os seus efeitos positivos sobre os níveis de educação e saúde dos filhos e filhas das famílias beneficiadas”, completa.